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Ganho contábil gera impasse no pagamento de dividendos

Diante do aumento do lucro líquido com variação cambial, sem efeito caixa, e queda de receita, empresas podem rever política de distribuição de lucro

Fonte: Valor Econômico

Silvia Rosa

O ganho contábil gerado pela valorização do real em relação ao dólar que impulsionou os ganhos das empresas no segundo trimestre pode gerar um impasse em relação ao cumprimento do pagamento de dividendos mínimo.

Diante da possibilidade de registrar resultado líquido positivo em 2009, beneficiada pela variação cambial, a Braskem anunciou que poderá rever o valor mínimo do pagamento de dividendos aos acionistas referente ao resultado do exercício de 2009 de 25% do lucro líquido ajustado da empresa, segundo a Lei das Sociedades por Ações.

Carlos Fadigas, vice-presidente de finanças e relações com investidores, diz que a proposta de revisão do valor dos dividendos a serem distribuídos se deve ao forte impacto do câmbio no lucro da companhia, sem efeito caixa, como medida para manter a capacidade de investimento.

"Num cenário em que a empresa fique com lucro líquido de R$ 2 bilhões, acho razoável que a gente discuta internamente uma proposta de distribuição de dividendos que não seja obrigatoriamente os 25% disso, tendo em vista os investimentos que a empresa tem que fazer para frente."

O lucro líquido da Braskem subiu 186% no segundo trimestre ante o mesmo período do ano passado, somando R$ 1,156 bilhão.

A companhia, no entanto, registrou uma queda de 20% da receita líquida no segundo trimestre no comprativo anual, totalizando R$ 3,668 bilhões. O lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização - um indicador de desempenho operacional - foi de R$ 566 milhões, com crescimento de 2%.

"Mesmo com ganho contábil, a geração de caixa da empresa continua fraca e a distribuição de 25% do lucro em dividendos poderia gerar um aumento do índice de alavancagem, o que não seria interessante para os acionistas", afirma Luiz Otávio Broad, analista da Ágora Corretora.

A empresa, que tem uma política de pagamento de dividendos anual, já não distribuiu os proventos referentes ao exercício de 2008 em função do prejuízo de R$ 2,5 bilhões registrado no ano passado.

Broad ressalta que, com exceção de 2008, a Braskem tem pago uma média superior aos 25% obrigatórios em dividendos aos acionistas, de cerca de 46% do lucro líquido nos três anos anteriores.

A Lei das Sociedades por Ações permite que a empresa suspenda ou reavalie a distribuição do dividendo obrigatório, caso seja incompatível com a sua condição financeira, estando essa avaliação sujeita à aprovação da assembleia geral dos acionistas.

Em caso de suspensão, os lucros não distribuídos deverão ser alocados a uma reserva especial e, se não compensados com prejuízos subsequentes, deverão ser distribuídos a título de dividendos tão logo a situação financeira da companhia possibilite tal pagamento.

Foi o que aconteceu com a Eletrobrás, cujos dividendos retidos pela estatal entre o fim da década de 70 e 80 totalizam R$ 8,5 bilhões.

Para a coordenadora geral do Centro de Conhecimento do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa, Adriane de Almeida, as empresas têm que oferecer maior previsibilidade aos acionistas, definindo na sua política de pagamento de dividendos os fatores que podem afetar a sua distribuição. A orientação em relação à política de dividendos foi incluída na versão atualizada do Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa do IBGC, que será lançada no começo de setembro.

Segundo Adriane, uma das opções para evitar esse tipo de impasse quando o lucro é inflacionado por um ganho contábil é definir como fundamento o pagamento atrelado ao fluxo de caixa da empresa. "Seria uma opção para as empresas que tiveram um grande lucro, mas não tiveram efeito caixa para poder reduzir o valor dos dividendos a serem pagos. Porém esse pagamento não pode ser menor que a distribuição de 25% do lucro líquido."

Ela destaca que para as empresas que têm posição de caixa confortável, o pagamento mínimo de dividendos continua obrigatório mesmo em casos de lucro gerado por efeito contábil.

A Gol, que também teve o lucro impulsionado pelo ganho com a variação cambial, informou em nota que pagará dividendos de 25%, independentemente do resultado ser ou não caixa. "A atual política da companhia é de pagar anualmente esse percentual se houver lucro."

O lucro líquido da companhia somou R$ 353,7 milhões no segundo trimestre, ante prejuízo de R$ 166,5 milhões registrado no mesmo período do ano passado, em função do ganho financeiro líquido de R$ 370 milhões no trimestre.

A receita entre abril e junho, no entanto, caiu 4,8% para R$ 1,39 bilhão. O saldo de caixa da empresa ao fim de junho era de R$ 613,7 milhões, 55% maior do que o registrado no primeiro trimestre.

Além da distribuição de dividendos, as empresas que tiveram crescimento do lucro em relação ao ano passado também devem aumentar a provisão para pagamento de Imposto de Renda. Levantamento realizado com 255 empresas de capital aberto que já divulgaram os resultados do segundo trimestre apontou um crescimento de 15% dessas provisões em relação ao mesmo período de 2008. Nesse caso o ganho com variação cambial recebe uma tributação diferida para efeitos fiscais, ou seja, o IR incidente será pago quando a transação for liquidada, pelo valor ajustado.